sábado, 1 de dezembro de 2007

aeroporto

Meu caro André, como digo aqui, o problema não é de legitimidade, é de timing. A Associação Comercial do Porto pode (e deve) fazer os estudos que entender. No caso concreto do futuro aeroporto de Lisboa, chegou atrasada. Chegaram todos atrasados. O lobbying contra a Ota devia ter começado em 1999, ano em que o governo de então determinou que seria na Ota, e não noutro sítio, que seria construído o futuro aeroporto de Lisboa (como sabe, o problema arrastava-se desde 1969; a decisão de Guterres foi tomada ao fim de 30 anos de estudos). Mas não. A opinião pública acordou na Primavera de 2005, depois da posse de Sócrates, porque era preciso arranjar uma questão que fizesse mossa a um governo acabado de eleger que tinha a ousadia de acabar com os subsistemas de saúde de magistrados, militares e polícias; que se preparava para tirar às farmácias o monopólio da venda de medicamentos; que mandou fechar maternidades (o primeiro a fazê-lo desde Leonor Beleza nos anos 1990); que estabelecia regras para a acumulação de honorários e pensões pelos detentores de cargos políticos (a famosa demissão de Campos e Cunha, lembra-se?, incomodado por, enquanto ministro das Finanças, ter de abdicar da pensão que recebia do Banco de Portugal...); que fixava limites temporais para cargos electivos; que alterava as regras de concessão das subvenções vitalícias dos deputados; que aumentava o tempo de serviço dos funcionários públicos, nivelando-o pelo dos trabalhadores do regime geral; que reduziu as férias judiciais; enfim, algo que mobilizasse a opinião pública contra o despotismo iluminado da maioria absoluta do PS, maioria que tivera o topete de mexer nas famosas conquistas... Impossibilitada de reagir — a esquerda democrática estava a fazer o serviço “sujo” que ela, direita, não fora capaz de fazer —, a direita arranjou o pretexto da Ota. Um pretexto coxo. Mesmo assim, o estudo da CIP chegou com dois anos de atraso. No Verão de 2005 teria feito algum sentido (o óbvio seria sempre em 1999). Porquê só no Verão de 2007? Como também sabe, a Associação Comercial do Porto tentou integrar o núcleo de financiadores desse estudo. A CIP, por razões que desconheço, recusou. E a ACP tomou a decisão de fazer um estudo autónomo, ao que se diz mais caro que o da CIP, tornando-o público há meia dúzia de dias, ou seja, a duas semanas da decisão do LNEC. Não está em causa o mérito desse estudo. Mas em que país do mundo uma decisão política envolvendo consequências económicas e financeiras de tal monta, seria sucessivamente adiada à medida que a entidade A ou B tirasse um coelho da cartola? Tendo ficado claro, há seis meses, que o LNEC ia comparar os estudos da Ota com o que a CIP fez para Alcochete — vénia que o governo prestou ao contraditório —, parece-lhe razoável, no fim do prazo, vir dizer “nós também temos um, tomem lá isto em conta...”!? Não, meu caro André, não é razoável. O Porto tem muitos problemas, entre eles a definição do estatuto do Aeroporto Francisco Sá-Carneiro, e decerto o contributo da ACP seria valiosíssimo para os resolver. Definitivamente, o futuro aeroporto de Lisboa, fique onde ficar, é um assunto que não diz respeito à ACP. Não podemos inventar uma regionalização invertida. Já agora, quanto a serem os nossos (os seus e os meus) impostos a financiarem a construção do futuro aeroporto de Lisboa, isso é verdade para 20% do montante global. Como sabe, a parte de leão (80%) é assegurada pela UE e privados.

Eduardo Pitta
http://www.daliteratura.blogspot.com/

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