domingo, 10 de outubro de 2010

Natália Correia

Dão-nos um lírio e um canivete
e uma alma para ir à escola
mais um letreiro que promete
raízes, hastes e corola

Dão-nos um mapa imaginário
que tem a forma de uma cidade
mais um relógio e um calendário
onde não vem a nossa idade

Dão-nos a honra de manequim
para dar corda à nossa ausência.
Dão-nos um prémio de ser assim
sem pecado e sem inocência

Dão-nos um barco e um chapéu
para tirarmos o retrato
Dão-nos bilhetes para o céu
levado à cena num teatro

Penteiam-nos os crâneos ermos
com as cabeleiras das avós
para jamais nos parecermos
connosco quando estamos sós

Dão-nos um bolo que é a história
da nossa historia sem enredo
e não nos soa na memória
outra palavra que o medo

Temos fantasmas tão educados
que adormecemos no seu ombro
somos vazios despovoados
de personagens de assombro

Dão-nos a capa do evangelho
e um pacote de tabaco
dão-nos um pente e um espelho
pra pentearmos um macaco

Dão-nos um cravo preso à cabeça
e uma cabeça presa à cintura
para que o corpo não pareça
a forma da alma que o procura

Dão-nos um esquife feito de ferro
com embutidos de diamante
para organizar já o enterro
do nosso corpo mais adiante

Dão-nos um nome e um jornal
um avião e um violino
mas não nos dão o animal
que espeta os cornos no destino

Dão-nos marujos de papelão
com carimbo no passaporte
por isso a nossa dimensão
não é a vida, nem é a morte

Natália Correia

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Vida

A nuvem de cinzas do vulcão islandês Eyjafjöll, que parou os aeroportos europeus em Abril e Maio, pode ter gerado mais vida no mar, noticiou hoje a BBC News.

Uma equipa de cientistas está a recolher informação para perceber de que forma a erupção vulcânica afectou a biologia marinha no Atlântico Norte, ao ponto de provocar o florescimento de uma enorme quantidade de algas microscópicas.

A um mês de terminar a segunda expedição na região, os investigadores detectaram "níveis elevados" de ferro nas amostras de sedimentos recolhidas do oceano.

"Verificámos alguns níveis elevados [de ferro dissolvido] entre 20 a 40 metros de profundidade. [Isso] pode ser resultado das cinzas vulcânicas, mas temos de verificar melhor, a uma escala maior", assinalou Eric Achterberg, professor da Universidade de Southampton, no Reino Unido, que lidera a equipa de cientistas.

Os investigadores pretendem certificar-se de que as partículas de ferro contidas na nuvem de cinzas vulcânicas entraram no mar e causaram o aparecimento de uma extensa mancha de minúsculos organismos, conhecidos como fitoplâncton, que têm a capacidade de fazer a fotossíntese (processam o dióxido de carbono e produzem
oxigénio).

Para o efeito, estão a recolher amostras de ferro, e de outros nutrientes, das águas e da atmosfera e a monitorizar o crescimento biológico no Atlântico Norte.

A confirmarem-se as suspeitas, o fitoplâncton no Atlântico Norte poderá estar "a processar mais dióxido de carbono do que a quantidade habitual num ano normal", apontou Eric Achterberg.

A equipa de cientistas promete divulgar "dentro de meses" os resultados da investigação.

A expedição, que arrancou, numa primeira fase, na primavera, insere-se num projecto ambiental mais vasto de investigação da eficácia do fitoplâncton na absorção e sequestro de dióxido de carbono em águas profundas.


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